Da Esperança - Margarida Correia

Da Esperança

Perguntaste-me o que é isso,

apontando para os joelhos esfolados.

Respondi-te caí. Caio muitas vezes, sabes?

Ainda te mostrei as palmas das mãos,

calejadas e arranhadas. Os cotovelos negros.

Toda eu um vaivém em cicatrizes, 

feridas mais ou menos saradas

que o sol amanhece na pele sem protetor.

Sigo em frente, livre para atropelar

o sonho desse dia.

Não há brilho que desfaça,

deslace ou encandeie o coração,

mesmo que o transborde.

É esta mania de ler a solidão dos olhos

e levantar bandeiras sem descansar.

Leva-me pela ousadia do riso de uma criança.

(Já paraste para escutar a inocência desse riso?)

A verdade é que se compartimentasse os sonhos

teriam eles comando para se erguerem perante a vida?

Um dia um levanta o dedo, um espreita

noutro instante e, logo de seguida,

já está outro em bicos de pés.

Ainda que conte carneirinhos a atropelarem-se

nas noites que se encostam aos olhos,

as manhãs despertam vencedoras.

E, embora esteja agora na cozinha

de toalha enrolada aos cabelos e segure

uma caneca azul a dissipar-se em fumo,

o final do dia será só e tão somente

sobre o amor oferecido, de mãos estendidas.

                            

A magia do estar sempre um passo acima do  pé.

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AUTOR(A)
Margarida Correia
Margarida Correia

Margarida Correia é natural de Lisboa. É Mãe, licenciada em Gestão e informática de profissão.

Viciada no poder da palavra escrita, a folha branca e o carvão são a extensão da mão desde a adolescência. Escreveu em pregões da Blitz, quando era um jornal. Arriscou no DN Jovem. Rabiscou em blogs, murais e fóruns de escrita. Apaixonada pela poesia, é nela que encontra o equilíbrio, possuindo mais de trezentas páginas, guardadas por aí.

Durante a pandemia, sentiu curiosidade em aprender mais sobre o ofício da escrita, tendo frequentado uma «Oficina de Poesia», com o escritor José Luís Peixoto, os programas «Escrita em Ação» e «Livro em Ação», dinamizados por Analita Alves dos Santos e o curso «Escrita de narrativa original do princípio ao fim», do escritor Afonso Cruz.

Tem poemas publicados em algumas coletâneas de poesia e em revistas digitais. Participa ainda com o conto «Contramão» na coletânea de contos «Que o caminho não nos fuja».

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