Crescemos a ouvir dizer que tudo na vida tem um preço. Convenceram-nos de que tudo o que é raro, inacessível e exclusivo é deslumbrantemente caro, para não estar acessível à maioria de nós. Os bens considerados de luxo estão quase sempre associados ao desejo, à luxúria e à satisfação de necessidades supérfluas, aquilo de que não precisamos para sobreviver, mas que continuamos a desejar para viver um pouco melhor — justificamo-nos. À partida, ninguém precisa de um carro com estofos de pele para conseguir deslocar-se do ponto A para o B. Se o faz, se o pode fazer, se, na escolha de um automóvel, tem a possibilidade de adicionar esse extra ao catálogo de opções, é porque isso trará um conforto adicional à sua necessidade básica, que continua a ser (apenas) conseguir deslocar-se do ponto A para o (ponto) B. É (só) para isso que servem os bens de luxo, para adicionar extras ao nosso catálogo de necessidades básicas. Se pudermos ter mais, porque haveremos de desejar menos?
Claro que isto é ter uma visão muito redutora sobre a função dos bens disponíveis para consumo, tenham eles o preço que tiverem. Quis fazer esta analogia, pois parece-me que a questão principal se centra precisamente aí: nos bens que temos disponíveis para consumo, nos que que existem, com uma maior ou menor acessibilidade, para os termos ou, pelo menos, para os desejarmos.
Mas, e se estivermos a falar de outro tipo de bens? De bens não materiais? Dos que não são mensuráveis, dos que não são visíveis e que nem sequer são palpáveis? E se a vida nos ensinar, muitas vezes à nossa custa, que afinal existem alguns que são mais valiosos do que a soma de todos os luxos do mundo? E mais. E se a vida nos mostrar, através dos desafios e das lições que tem guardado para nós, que muitos desses bens de luxo afinal não têm qualquer valor se comparados com o que de verdade importa, que é saber que por muitas coisas que tenhamos para ostentar, elas não terão qualquer utilidade se não tivermos as nossas pessoas por perto para as partilhar.
É que, vistas bem as coisas, passamos uma vida inteira a lutar para sermos melhores do que os outros e esquecemo-nos de que o verdadeiro luxo é tentar ser, todos os dias, um bocadinho melhor do que no dia anterior. E (con)viver bem com isso. Aceitar que as nossas decisões, muitas vezes mais erradas do que certas, são o resultado do nosso caminho e que esse só a nós diz respeito. Perceber que nem sempre vamos ganhar, mas, iremos sempre aprender. Que não conseguiremos gradar a todos, mas que há uma pessoa a quem nunca podemos deixar de agradar: a nós. Que o que ontem fazíamos questão, hoje deixou de ter importância. Que nem todas as pessoas vão ficar na nossa vida e que nós também não somos obrigados a aceitar tudo (e todos). Que não precisamos de ser perfeitos, mas que precisamos de continuar a ser felizes mesmo com as nossas imperfeições. E isto, meus amigos, isto que nos sai do âmago, que se constrói de dentro para fora, que nos corre debaixo da pele, isto não tem preço. Chama-se paz (interior) e é um dos bens mais valiosos que podemos ter. Aquele que devemos conservar a todo o custo e que não devemos permitir que ninguém nos roube. Não há nada que chegue à nossa paz e tudo o que custe a paz (interior) é demasiado caro para estar à venda. Porquê? Porque no final, as contas acertam-se com a nossa consciência (e não com os outros).