Quando nascemos, nascemos nós. Nascemos despidos de roupas e ignoramos o preconceito. Dizem os antigos que já trazemos a alma carregada com a própria essência e que não haverá ninguém igual a nós. Somos seres especiais – convencem-nos. Viemos ao mundo para sentir, realizar e…agradar. Só que, aqui, o “agradar” é camuflado pelo mantra “ser feliz”. Ah! Agora sim; viemos ao mundo para ser feliz. Soa melhor.
Mas o que é isto de vir ao mundo para ser feliz?
É simples (ou deveria ser). Ser feliz é exaltar a nossa essência, engrandecê-la, deixá-la sair cá para fora, celebrá-la todos os dias e vivermos (de) bem com isso. No fundo, ser feliz não deveria ser mais do que a possibilidade de sermos nós. Como quando nascemos, que nascemos nós (e não com uma carrada de pessoas à volta a impingirem-nos a fórmula da felicidade).
Nenhuma criança quando vem ao mundo é autónoma. Aliás, nenhum ser vivo quando nasce é autónomo. Todos precisam dos outros para se alimentar, para matar a sede e para dar os primeiros passos. O que acontece a seguir é o que nos distancia dos outros animais. Enquanto uns aprendem a ser livres e felizes, sem depender dos seus pares, nós, os tais seres especiais, continuamos dependentes que os outros nos digam como devemos ser felizes.
Desde (demasiado) cedo condicionamos a nossa vida para agradar os outros, convencidos de que assim iremos encontrar a felicidade. Se fizermos isto, os outros vão gostar de nós; se dissermos aquilo os outros vão ficar felizes; se nos comportarmos assim não desagradamos aos outros e se não desagradarmos (muito) aos outros, talvez os outros se agradem por nós. E se os outros gostarem de nós, então (já) podemos ser felizes.
Só que.
O tempo passa e percebemos (e sentimos) que os outros, muitas vezes, pesam-nos mais do que nos aliviam, diminuem-nos mais do que nos acrescentam e doem-nos mais do que saram. Pautamos a nossa existência por comportamentos subordinados às expectativas que os outros têm sobre nós e não pela partilha da nossa verdadeira essência com os outros. É desta forma que os outros nascem na nossa vida. Os outros isto, os outros aquilo. Os outros fazem, os outros acontecem, os outros dizem, os outros acham.
Só que.
A vida é hábil. E teima em colocar as coisas (e as pessoas) no sítio certo. E é quando isso acontece que percebemos que por mais que os outros sejam importantes na nossa vida (e são), não podem ser mais importantes do que nós. Não podemos deixar que os outros se substituam à nossa felicidade. Não vamos agradar a toda a gente. Nem todos vão aceitar as nossas escolhas. Os outros não somos nós e (só) cada um sabe o que se passa dentro de si.
Só que.
Passamos metade da vida a tentar agradar os outros para que depois sejam os outros a ensinarem-nos que quem vive (só) para agradar os outros, não se consegue agradar a si.