Solitude - Margarida Correia

Solitude

Amanheces naquela teimosia que o sol nasce todos os dias

e nas mãos as linhas renovam-se nos atropelos dos dedos curvados

entrelaçados numa ideia que fica por ali perdida 

na berma dos lábios. 

Já não sabes decifrar sorrisos, nem tão pouco sabes o que queres;

os movimentos parecem-te iguais, demasiado translúcidos, 

descompensados apressados atrasados,

ainda que tragam a dor de mais uma torção na invisibilidade 

de ler nos olhos o abandono que eles gritam.

Espantas-te, imagina, ao fim de tanto tempo

ainda te espantas,

as pessoas focadas naquilo que as faz caminhar,

a imagem refletida no espelho,

a transbordar uma positividade

exposta em fotografias que ficam;

e tu, o cansaço como ilha, 

à espera que a ponte surja no nevoeiro a que te atiraste

como naquele dia em que te lançaste para outros braços, 

na esperança de que formassem um arquipélago,

somente para que o teu sangue colidisse com um coração.

Porque no fim só restam os outros

e os outros, às vezes, até somos nós.

E se parássemos para observar o desenrolar da folha de uma planta

talvez até questionássemos: 

 

ainda haverá mundos por vir?

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AUTOR(A)
Margarida Correia
Margarida Correia

Margarida Correia é natural de Lisboa. É Mãe, licenciada em Gestão e informática de profissão.

Viciada no poder da palavra escrita, a folha branca e o carvão são a extensão da mão desde a adolescência. Escreveu em pregões da Blitz, quando era um jornal. Arriscou no DN Jovem. Rabiscou em blogs, murais e fóruns de escrita. Apaixonada pela poesia, é nela que encontra o equilíbrio, possuindo mais de trezentas páginas, guardadas por aí.

Durante a pandemia, sentiu curiosidade em aprender mais sobre o ofício da escrita, tendo frequentado uma «Oficina de Poesia», com o escritor José Luís Peixoto, os programas «Escrita em Ação» e «Livro em Ação», dinamizados por Analita Alves dos Santos e o curso «Escrita de narrativa original do princípio ao fim», do escritor Afonso Cruz.

Tem poemas publicados em algumas coletâneas de poesia e em revistas digitais. Participa ainda com o conto «Contramão» na coletânea de contos «Que o caminho não nos fuja».

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