A túnica, de tão brilhante,
faz piscar os olhos.
A seda, perfumada e doce,
calou a sala por um instante.
A história interrompe-se.
Apenas os vermelhos vivos
se riem descarados
dos verdes, esquecidos da sua identidade.
Os amarelos, esbatidos pelo tempo, observam.
Todos desfilam, à vez,
por paredes e escaparates silenciosos,
ao ritmo caleidoscópico
tornado lento por tantas voltas.
Tolhida por segredos e enredos,
a chave do futuro perdeu a memória:
não sabe se há-de rodar
para a esquerda,
ou para a direita.
Um crânio, com repas cor de terra pisada
esvaído de juízo, decide ir pensar
dentro do triângulo rectângulo,
junto à casa de Pitágoras,
em Siracusa.
Descobre que já não sabe de que lado fica
a soma do quadrado dos catetos e,
muito menos, a hipotenusa.
A história recomeça numa nova canção
com palavras que jorram dos versos coloridos de um diapositivo.
A música salta das espiras escurecidas de um disco empenado de vinil.
Unidas, embalam o sono em sobressalto
de um homem com muita idade,
que a todos diz estar bem.
Uma criança arrojada,
ignora o não que lhe gritam,
enquanto decide se deve voar dos muros
da cidade que lhe serve de ninho.
Enquanto isso, a túnica brilhante,
continua a alimentar a ilusão,
no seu rodopio caleidoscópico.
Nota: por desejo do autor, este conto não segue o Acordo Ortográfico de 1990


