Há pecados que talvez devam permanecer encerrados em caixas misteriosas. Ou mesmo em algumas (poucas) memórias.
Nunca tinha lido este autor, que me foi dado a conhecer por outro escritor.
Mais um livro que fui buscar à Biblioteca Municipal de Coimbra. De salientar, sempre, o importante lugar que as bibliotecas ocupam na vida de um leitor.
A história passa-se em dois momentos diferentes — os anos da Segunda Guerra Mundial e 2017 —, com apontamentos de outras épocas pelo meio. Também os espaços se dividem entre Lisboa e os Açores, com incursões por vários pontos do mundo. Mas é este meridiano que atravessa os Açores o ponto fulcral da história.
Achei muito interessante a lista de personagens com que o escritor nos brinda, no início — tal como Gabriel García Márquez, na minha edição de Cem anos de solidão. Também aqui não nos perdemos e os nomes de algumas personagens passam a ser irrelevantes.
Na cosmopolita, culta e moderna cidade da Horta, durante os anos trágicos da Segunda Guerra Mundial, ingleses, alemães e portugueses convivem em perfeita harmonia. Apesar da base naval, com os navios de guerra atracados, também ali desembarcavam grandes estrelas de cinema de Hollywood. Passeava-se, dançava-se, jogava-se ténis. É aqui que vive Hansi Abke, que vai desencadear toda a história. É neste local e neste tempo que, muitos anos mais tarde, o seu “sobrinho”, José Filemon, vai encontrar as respostas que procura e as que nem sabia que procurava. Espicaçado por um milionário nova-iorquino, que lhe paga para escrever um livro sobre o tio, suposto caçador de nazis, envolve-se numa trama de suspense e viagens. Tudo isto entre caixas e diários misteriosos. Na verdade, este homem procura saber quem foi o tio, sem perceber que busca a sua própria identidade.
É um thriller, um romance de ação, uma narrativa de viagens e uma narrativa histórica. Trama urdida pelo autor, que vai deixando cair aos poucos, de forma imprevisível, episódios que nos agarram, histórias que se entrelaçam. Um enredo complexo, de expectativa crescente, com pistas enganadoras, lançadas para nos deixar imaginar desenlaces ilusórios.
No final, resolvem-se alguns dilemas morais que o livro nos foi apresentando e as respostas inesperadas aos enigmas trazem apaziguamento.
Da narrativa, retirei a ideia da fragilidade do ser humano, que é tão misterioso para os outros como para si, quando se enraíza profundamente nas suas convicções e se é vítima delas.
Mesmo para nós, tal como na história, nem sempre o que parece é.
“Quem disse que o nosso futuro está nas nossas mãos enganou-nos — mesmo que se tenha enganado primeiramente a si mesmo.”
Quer saber de quem são estas palavras? Leia o livro e deixe um comentário num dos espaços d’ O prazer da escrita.


