um amor supremo

esta é.                                    a alvorada.

sagrada renúncia à efemeridade à letargia & tornar cada noitada o extenso lânguido sibilo do saxofone de coltrane amor supremo amor supremo amor supremo! arrebata a imortalidade e a imprevisibilidade das garras das fatídicas estatísticas

 

por favor não desesperes mais

até que os nossos segundos se tornem fatais

 

oh genuíno doloroso poderoso amoroso destino

não empacotado para prolongar a vida de prateleira

não executado para chegar à certeira satisfação

não apregoado por quem erra de escritórios para peditórios e templos

não invocado para dividir a terra em fronteiras ou barreiras ou lixeiras &

o que protege também captura

 

amo-vos mal pagas empregadas de limpeza saem da casa às cinco da manhã para regressar às intermináveis vinte e duas horas quebradas mas inquebráveis

amo-vos estafetas que conhecem os recantos da cidade como a mãe conhece os refegos do recém-nascido

amo-vos jovens que dedicaram a vida a estudar a quem não resta nada que não a exploração e a submissão total e absoluta mas fazem de tudo uma luta

amo-vos putas e gigolos strippers e acompanhantes que se oferecem para colmatar a implacável sofreguidão dos yuppies que não sabem lidar com a frustração de esbanjar a existência para ter dinheiro para esbanjar

amo-vos crianças e adolescentes que herdarão esta sociedade decrépita e caquética

amo-vos freaks punks rastas sem-abrigo artistas dreads escritores actores beats rappers revolucionários filósofos junkies drags monges ermitas filósofos

 

amo-vos neste esquema de pirâmide que dizem democracia como na comuna não desperdiçar o dia na busca de fortuna e cumprir a profecia de sun tzu:

di/vi/dir/ para rei/nar

 

     imolar-me

no ardor do nosso supremo amor

enquanto chama

 

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AUTOR(A)
Cobramor

Cobramor é o pseudónimo literário de Hugo Filipe Lopes, praticante de poesia vadia, escritor amaldiçoado, de alma Beatnik, espírito libertário e inspiração mística. Formado em sociologia, nasceu na década de 70 numa Lisboa há muito desaparecida e emigrou recentemente para o sul profundo para tentar viver deliberadamente.

Premiado no concurso Lisboa à Letra e mencionado no concurso de poesia da Casa da Moeda, fez também traduções literárias de nomes como John Zerzan, Robert Frost, Patti Smith ou Bill Wolak.

Publicou o seu primeiro livro, “O fim da noite” em 2016 pelas publicações Nabo e o seu mais recente trabalho, “Sol Invicto”, pela editora Traça.

Tem participações em diversas revistas e eventos literários, encontrando-se de momento numa digressão literária pelos sítios prováveis e sobretudo pelos mais improváveis.

Brevemente conhecerá a luz do dia o seu primeiro livro infantil, “O atlas do coração”.

Está sempre aberto a propostas e parcerias, de preferência, indecentes, improváveis e até inacreditáveis.

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